quarta-feira, 14 de maio de 2008

A política e os portugueses!

O Presidente da República (PR) conseguiu, desta vez, fazer-se ouvir na comemoração de mais um 25 de Abril. Num discurso muito interessante - mesmo que a memória não nos atraiçoe e saibamos que a teoria contraria a prática do próprio PR que foi também Primeiro-Ministro e líder de um grande partido durante 10 anos - o PR trouxe para a discussão pública a questão da descredibilização da actividade política e dos próprios políticos e o desencanto dos cidadãos perante a política. O Sr. Presidente da República chegou às seguintes conclusões (a partir de um estudo que encomendou à Universidade Católica):

a)Portugal tem uma juventude dinâmica, empreendedora e solidária mas muito afastada e desinteressada pela política; b) os portugueses estão notoriamente insatisfeitos com o funcionamento da democracia; c) os portugueses são favoráveis a reformas profundas na sociedade portuguesa; d) os portugueses são cépticos em relação à eficácia da participação através dos partidos; e) os portugueses são favoráveis à presença das mulheres na vida política, à criação de novos mecanismos de participação e à maior personalização do sistema eleitoral; f) os Portugueses são dos europeus com uma pior avaliação do funcionamento da democracia (além da Hungria e da Eslováquia, Portugal é o país europeu em que os cidadãos dão menos importância à política nas suas vidas).

Perante este cenário assustador, a pergunta é inevitável: O que fazer? Ou melhor, é possível fazer algo para mudar este quadro negro da democracia portuguesa?
O Presidente da República, que acusa os partidos políticos de serem responsáveis por esta situação, acha que sim, e já esta semana começou a reunir com juventudes partidárias (embora excluindo o Bloco de Esquerda dessa reflexão, devido a aspectos formais…).

Porque é que os portugueses não acreditam na política nem nos políticos?
1. Porque falta, na actividade política, sentido de compromisso/responsabilidade/responsabilização efectiva das decisões e actuações de muitos políticos (decisões erradas e prejudiciais para o país, o concelho ou a freguesia, nunca são verdadeiramente avaliadas, para além do voto do povo).
2. Falta coerência no discurso e actuação de muitos políticos (habituamo-nos, infelizmente, a considerar natural que um político em campanha eleitoral diga uma coisa para depois das eleições fazer exactamente o contrário). Falta verdade na política!
3. Falta transparência e abertura na comunicação com os cidadãos (só assim se compreende que, aliado ao alheamento dos próprios cidadãos, políticos manifestamente incompetentes ganhem sucessivamente eleições – o que dizer, por exemplo, do desempenho de Avelino Ferreira Torres, que nunca, em Marco de Canaveses, perdeu uma eleição?
4. Falta consciência efectiva de cidadania política. Habituamo-nos, desde pequeninos, que é fundamental a participação em actividades religiosas (catequese, missa, casamento, etc…) mas não fomos educados a ir a assembleias de freguesia, a conhecer o programa de um partido político ou a intervir em público. E talvez a política influencie mais as nossas vidas do que a religião…
5. Falta interesse (estratégico!) dos próprios políticos (e respectivos partidos) para fomentar a participação dos cidadãos (cidadãos passivos e menos informados são cidadãos menos críticos e menos incomodativos). Como é possível, por exemplo, que um candidato a uma Câmara Municipal como Famalicão, com 120 mil habitantes, seja eleito/sugerido, num partido, apenas por duas ou três centenas de cidadãos/militantes? É preciso acabar com o funcionamento dos partidos como se de clubes privados se tratasse. Acabar com o pagamento de quotas, como defendeu Luís Filipe Meneses, e universalizar a militância partidária, talvez fosse um caminho.
6. É preciso que os cidadãos escolham efectivamente os melhores, não só para o exercício do poder mas também para a oposição. Mas, aparentemente, na política, continua a vigorar a Lei de Gresham: a má moeda tende a expulsar do mercado a boa moeda, tal a blindagem que o próprio sistema político já se encarregou de criar.
7. Não se faz a renovação dos protagonistas dos principais cargos políticos. Também nos habituámos (desde pequeninos…) a ver sempre os mesmos nos mesmos cargos, independentemente da demonstração de competência que fazem no exercício dos cargos. (porque é que, por exemplo, a limitação de mandatos ainda não foi aplicada na Assembleia da República?)
8. Falta uma verdadeira educação nas escolas para a participação política. As escolas estão inundadas de clubes do ambiente ou da ciência, ou da Europa, mas não têm clubes direccionados para a formação e motivação para a participação política. O Papel da família e das associações não é suficiente para mudar mentalidades e comportamentos.
São apenas algumas ideias. O importante é que, como também afirma o presidente da República, não nos resignemos e acreditemos que é possível um Portugal melhor, mais justo, e, sobretudo, com uma democracia ao serviço do bem-estar de todos e não apenas de alguns.
Mas para isso temos que lutar muito nos tempos que se avizinham…




Sérgio Cortinhas


Texto publicado no Jornal Repórter Local

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